Fectrans analisa contas de transportadoras

<i>Buraco</i> escorre para os bancos

Nas contas de 2011 da STCP, da Refer e da CP, fica claro que o pro­blema fi­nan­ceiro das trans­por­ta­doras in­te­gradas no sector em­pre­sa­rial do Es­tado está nos mi­lhões de euros pagos em juros à banca.

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A Fe­de­ração dos Sin­di­catos de Trans­portes e Co­mu­ni­ca­ções di­vulgou nos dias 11, 12 e 17 deste mês, no seu sítio na In­ternet, três su­cintas notas sobre os Re­la­tó­rios e Contas da So­ci­e­dade de Trans­portes Co­lec­tivos do Porto, da Rede Fer­ro­viária Na­ci­onal e da Com­boios de Por­tugal. Pelos dados das ad­mi­nis­tra­ções, a Fec­trans/​CGTP-IN con­clui que o au­mento de ta­rifas, a re­dução de sa­lá­rios, os des­pe­di­mentos, a re­dução da oferta não ser­viram para me­lhorar a si­tu­ação fi­nan­ceira das em­presas. Acima dessa pre­o­cu­pação ofi­cial, que jus­ti­fica a po­lí­tica ex­pressa no «plano es­tra­té­gico de trans­portes» (PET), está o ele­va­dís­simo vo­lume das verbas que são en­tre­gues aos bancos – como se com­prova nas contas.

Re­cor­damos que esta ma­téria foi re­cen­te­mente abor­dada nas nossas pá­ginas, em «A po­lí­tica de trans­portes do Go­verno – Ga­rantir o cres­ci­mento das rendas do Ca­pital», de Ma­nuel Gou­veia, no Avante! N.º 2011, de 14 de Junho de 2012 – ar­tigo que trata as contas de 2011 de onze em­presas deste sector: Carris, ANA, Metro do Porto, STCP, TAP, CP, NAV, Sata Air Açores, Sata In­ter­na­ci­onal, EMEF e Me­tro­po­li­tano de Lisboa.

 

STCP pagou
mais 20

 

Na STCP, os juros pagos à banca foram quase quatro vezes su­pe­ri­ores aos re­sul­tados do au­mento de preços e da re­dução de sa­lá­rios.

A Fec­trans as­si­nala que a verba de gastos com pes­soal passou de de 39,999 para 36,933 mi­lhões de euros, ou seja, baixou 7,7 por cento. Esta re­dução deve-se es­sen­ci­al­mente à re­dução nas re­mu­ne­ra­ções com o pes­soal (de 30,561 para 26,725 mi­lhões de euros, ou seja, 12,5 por cento), por via do des­pe­di­mento (passou de 1496 tra­ba­lha­dores para 1318) e por via da re­dução do preço pago pela força de tra­balho. Mas o di­nheiro para des­pedir tri­plicou, atin­gindo 2,871 mi­lhões de euros (954 mil euros em 2010).

Fruto do brutal au­mento do preço dos trans­portes, a re­ceita de ex­plo­ração au­mentou três por cento (de 49,3 para 50,8 mi­lhões de euros em vendas), apesar de ter trans­por­tado menos um mi­lhão de pas­sa­geiros (uma quebra de um por cento).

O saldo de ex­plo­ração po­si­tivo es­teve bas­tante acima do al­can­çado no ano pas­sado (6,119 mi­lhões de euros, face a 2,869 mi­lhões em 2010), mas o re­sul­tado lí­quido final é ainda mais ne­ga­tivo: passa de -37,677 para -54,545 mi­lhões de euros! Pesam aqui os 48,5 mi­lhões de euros que a STCP pagou de juros ban­cá­rios em 2011.

Este vo­lume de juros re­pre­senta mais 20,1 mi­lhões do que os 28,4 mi­lhões de euros que a em­presa pagou no ano an­te­rior.

«Se fi­zermos as contas, e so­marmos os 4 mi­lhões rou­bados ao tra­balho, com os 1,5 mi­lhões rou­bados aos utentes, dá-nos um total de 5,5 mi­lhões», que são «com­ple­ta­mente in­su­fi­ci­entes para a cres­cente gula da banca», co­menta a fe­de­ração.

A aná­lise das contas da STCP de­nota ainda um au­mento brutal dos custos de pro­dução li­gados ao com­bus­tível: mais 27 por cento no custo do ga­sóleo e da elec­tri­ci­dade por cem qui­ló­me­tros (res­pec­ti­va­mente, de 46 para 58,25 e de 33,03 para 42,04), o que re­sulta num desvio de um mi­lhão de euros «que foi di­rei­tinho para as mul­ti­na­ci­o­nais». Isto, para a Fec­trans, é «outro in­di­cador sobre o que está a acon­tecer a Por­tugal e às em­presas pú­blicas».

 

Refer
des­pediu 630

 

Fe­nó­meno se­me­lhante ocorreu na Refer: o con­sumo de energia baixou cinco por cento, mas a em­presa gastou mais 13,3 por cento em elec­tri­ci­dade (subiu de nove para 10,2 mi­lhões de euros).

Des­taca-se, nos nú­meros de 2011 da Refer, a perda de 630 tra­ba­lha­dores (de 3445 para 2815), muitos deles através de res­ci­sões «ami­gá­veis», em que a em­presa des­pendeu 26,8 mi­lhões de euros. Esta re­dução con­tri­buiu para que a em­presa ti­vesse gasto menos 13,1 mi­lhões de euros (14,9 por cento) em re­mu­ne­ra­ções. Mas, sa­li­enta a Fec­trans, o es­sen­cial de tal des­cida ficou a dever-se às re­du­ções de sa­lá­rios im­postas no Or­ça­mento do Es­tado de 2011. A Refer, ob­serva a fe­de­ração, optou por «pagar menos para tra­ba­lhar e pagar mais para des­pedir».

As me­didas do PET pro­vo­caram uma di­mi­nuição de trá­fego fer­ro­viário, o que gerou uma des­cida de cinco por cento nas re­ceitas de taxas de uti­li­zação (de 61,4 para 58,1 mi­lhões de euros). A in­dem­ni­zação com­pen­sa­tória man­teve-se (de 35,9 para 36 mi­lhões de euros). Desta forma, «o Es­tado con­tinua a sub­fi­nan­ciar a ope­ração da Refer e a impor-lhe o re­curso ao en­di­vi­da­mento».

O re­sul­tado ne­ga­tivo foi, em muito, in­flu­en­ciado pela gestão da dí­vida que su­ces­sivos go­vernos co­lo­caram na Refer. O re­sul­tado fi­nan­ceiro de 2011 foi de -72,3 mi­lhões de euros (fora de -41,4 mi­lhões, em 2010). Os juros com em­prés­timos cres­ceram de 137 para 192,6 mi­lhões de euros.

A Fec­trans pre­vine que, «como para 2012 a so­lução do Go­verno é a mesma de 2011 (roubar mais aos tra­ba­lha­dores), o quadro será ainda pior».

 

CP es­ma­gada

 

Na CP, houve em 2011 «um roubo mo­nu­mental nos sa­lá­rios». Os gastos com pes­soal caíram mais de 20 mi­lhões de euros (menos 18 por cento, pas­sando de 112,9 para 92,6 mi­lhões), com uma parte subs­tan­cial a dever-se à re­dução das re­mu­ne­ra­ções (caem de 90,1 para 73,7 mi­lhões). Houve uma re­dução de 263 tra­ba­lha­dores (oito por cento, de 3241 para 2978).

Também foram rou­bados os utentes. Mas o au­mento das ta­rifas, su­pe­rior a 20 por cento, con­vive com a su­bida de apenas 1,1 por cento nos pro­veitos de trá­fego, porque a CP perdeu 7,8 mi­lhões de pas­sa­geiros – o que se deve à re­dução da oferta, em sete por cento, mas também ao au­mento de preços e à re­cessão eco­nó­mica.

São os juros que «es­magam as contas da CP», porque re­pre­sen­taram uma des­pesa 13,4 por cento su­pe­rior à do ano pas­sado. As des­pesas com juros su­biram de 165,9 mi­lhões para 188,1 mi­lhões (mais de 22 mi­lhões).

O re­sul­tado ope­ra­ci­onal foi ainda mais po­si­tivo e atingiu 39,1 mi­lhões de euros. Mas o re­sul­tado lí­quido agravou-se em 85 mi­lhões de euros (de -204,9 para -289,4 mi­lhões).

Neste caso, «à custa dos tra­ba­lha­dores, dos utentes e das contas pú­blicas, o Go­verno co­locou a CP Lisboa, a CP Porto e o Longo Curso com re­sul­tados ope­ra­ci­o­nais po­si­tivos, con­dição para po­derem ser pri­va­ti­zadas», re­alça a Fec­trans, no­tando que «a pró­pria CP, se li­berta da dí­vida, está ope­ra­ci­o­nal­mente a dar saldo po­si­tivo» e po­derá ser le­vada pelo mesmo ca­minho.

 

Mais e mais em­prés­timos


Nas contas da CP, vê-se como o Go­verno «re­pete todas as taras que le­varam ao cres­ci­mento da dí­vida». A Fec­trans as­si­nala que, mais uma vez, vol­taram a ficar sub-or­ça­men­tadas as des­pesas de in­ves­ti­mento, como se ve­ri­fica pela origem das verbas para o in­ves­ti­mento re­a­li­zado em 2011: do PIDDAC (Or­ça­mento do Es­tado) vi­eram um mi­lhão e 925 mil euros; do Feder en­traram 129 mil euros; de en­di­vi­da­mento re­sul­taram 14,895 mi­lhões de euros.

Ou seja, o Go­verno mandou a CP re­correr a em­prés­timos ban­cá­rios para re­a­lizar 88 por cento do in­ves­ti­mento de 2011.

A Fec­trans ob­serva ainda que o in­ves­ti­mento re­a­li­zado pela Refer em in­fra­es­tru­turas de longa du­ração foi muito in­fe­rior ao de anos an­te­ri­ores, mas con­ti­nuou a ser sub-or­ça­men­tado. Num in­ves­ti­mento total de 268,8 mi­lhões de euros, o Or­ça­mento do Es­tado só ga­rantiu sete mi­lhões (2,5 por cento), os fundos co­mu­ni­tá­rios ga­ran­tiram 61,6 mi­lhões (23 por cento) e di­fe­rentes pro­to­colos ga­ran­tiram 5,7 mi­lhões (2,1 por cento). Os res­tantes 194,5 mi­lhões (72,4 por cento) teve a REFER que ga­rantir com en­di­vi­da­mento!

Ou seja, mais uma vez o Go­verno mandou fazer as obras e não as pagou, con­clui a fe­de­ração, cha­mando ainda a atenção para as obras que o Go­verno mandou a Refer exe­cutar e pagar: 27,1 mi­lhões de euros nas em­prei­tadas pre­pa­ra­tó­rias para a alta ve­lo­ci­dade; 75,3 mi­lhões na li­gação fer­ro­viária do Porto de Sines a Es­panha; dois mi­lhões na li­gação fer­ro­viária ao Porto de Aveiro; 33,4 mi­lhões nas áreas me­tro­po­li­tanas de Lisboa e Porto; 26,9 mi­lhões no Sis­tema de Mo­bi­li­dade do Mon­dego.



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